Algo que tenho me debatido e ponderado há algum tempo, é sobre o meu envelhecimento enquanto pessoa kinky.
Na sociedade em geral, e mesmo nas esferas kinky, há um peer-pressure de ‘perfeição’.
Mulheres jovens, magras, tonificadas e (em muitos casos) sem experiência são chamariz e alvo de atenções e – frequentemente – vistas como desejáveis pela facilidade de interagir em plays. Uma pessoa jovem e sem condições limitativas físicas, requer pouco esforço. É natural!
E essa pressão a determinada altura, é sentido globalmente e acaba por refletir-se nas pessoas que não têm mais 20 anos e como essas pessoas acabam por ter dificuldade em partilhar a sua natural evolução corporal e consequentemente envelhecimento.
Envelhecer é chato, terrível. Ninguém quer falar disso. Ninguém quer ver o envelhecimento de outrem pois isso lembra como cada um de nós está a envelhecer.
Eu sinto a pressão de forma indireta. Sinto que há pouca informação e partilhas de mulheres (especialmente mulheres mais pelo fator hormonal) sobre a sua jornada no envelhecer, que obstáculos sentem, como ultrapassaram e sim, as partilhas muitas vezes são fundamentais para termos ferramentas internas para lidar com os nossos desafios internos (agora a minha psicóloga irá ficar orgulhosa!).
Pessoas menos jovens, com características físicas que necessitem de esforço, mudança de atitude, mudança de pensamento em relação ‘ao que sempre foi feito’, são vistas como empecilhos, bottoms sem valor, menos boas bottoms (sobre este assunto, fica para um outro texto…). É esperado que as fotos que se partilhem sejam as mais hardcore, com as posições piores, quanto mais contorcionistas melhor. Tudo sempre no topo, no limite.
Sim, há pressão social nesta app e nas comunidades kinky em haver um certo nível de dor constantemente envolvido.
É verdade que tenho visto pessoas a partilharem as suas reservas quanto a este tipo de tendências e isso reflete-se no quanto a mentalidade kinky está a mudar, nem que seja gradualmente. Também tenho visto Tops a perguntarem aos seus seguidores por dicas para saberem mais sobre pessoas com diferentes características e – pessoalmente – eu delicio-me com este tipo de partilhas!
A nível pessoal, eu sinto que estou a mudar fisica e mentalmente.
Tenho quase 45 anos, estou a entrar em mudanças hormonais próprias para a minha idade, estou com problemas a nível de útero e o facto de, ter menos tempo para fazer exercício regular, tem sido um conjunto de fatores que – nos últimos meses – tem me levado a ter uma postura diferente quanto a mim mesma enquanto kinkster.
Sinto que a minha tolerância à dor flui muito mais do que antes e isso, tem me trazido conflitos internos, pois não estou preparada mentalmente para mudar, nem quero deixar de fazer o que sempre fiz e ter de adaptar-me a uma realidade nova, tem sido um desafio.
Sempre tive um build-up longo no que diz respeito à tolerância da dor e é algo reconhecido e percebido por mim como uma característica, mas agora o meu corpo por vezes diz-me: isso não. Como se, houvesse um alerta biológico de que aquilo não me irá fazer bem fisicamente. Bem sei que isso é normal, pelas partilhas que recebo de outras pessoas com idade semelhante à minha, mas sim é um desafio.
E pergunto-me para quantas mais pessoas esta situação ou situações semelhantes tem sido desafiante e quantas não têm conhecimento de ser algo natural e normal?
Fisicamente, é natural haver mudanças, músculos não são os mesmos, tendões ficam mais fracos, articulações ficam com mais ‘mazelas’. As hormonas acabam por nos definir, moldar.
No shibari, eu noto que algumas amarrações causam-me mais micro problemas (os danos são acumulativos) do que dantes e permito a mim mesma ter descanso quanto a essas amarrações, até porque eu quero fazer plays o mais tempo possível na minha vida, tenho que cuidar de mim.
O envelhecer também trazer mudanças a nível circulatório e conscientemente tenho percebido isso no meu corpo e ativamente analiso-me durante e após as plays. Existe tudo um conjunto de situações e novas vivências que me apercebo diariamente. O desafio e debate interno é real.
Só lamento que mais pessoas não exponham a sua realidade…
Também consigo perceber que este tipo de partilhas trás para cima da mesa, críticas:
“se não fazes X, és má bottom” “se não aguentas X, és má bottom” e as críticas fazem com que menos pessoas queiram efetivamente dar de si à comunidade.
Não somos meigXs para ninguém, nem para o próximo nem para nós mesmos. Mas acima de tudo, não somos empáticos com as outras pessoas. É preciso mais empatia, muito mais e muito menos egocentrismo. Muito menos.
A comunidade só cresce e beneficia como um todo quando à empatia e cooperação.
E agora, venham de lá essas críticas…